Em 2003 comecei a trabalhar em um programa de rádio que
propõe uma nova relação entre homens e
mulheres ,desde então atuo divulgando direitos, cobrando atitudes,abordando
assuntos que proporcione o bem viver de mulheres e homens;mas nunca achei que deveria me intitular feminista por falta de uma atuação mais
direta,incisiva.
Correto seria dizer que sou fruto e vivo as conquistas das feministas.
E sou grata a elas!
Como toda criança ,quando
pequena, vivia em um mundo de fantasias,mas mesmo cheia de imaginação, não deixei de ser
influenciada pelos acontecimentos da época. Adorava brincar de bonecas; de bonecas, não de cozinhadinha ,rs...
Nunca fui chegada à
cozinha ...
Nas minhas brincadeiras de casinha, minhas bonecas se
casavam e desquitavam quando não
estavam satisfeitas...
Desquite era a
novidade da época ,o escândalo da vez.
Não tinha Barbie e nem Ken, Suzie era a boneca da hora ,mas
eu não tinha a Suzie ,tinha outras mais simples . Quem fazia o papel de marido
era um velho coelhinho de plástico..aha hahaha...
Tive um pai provedor e que reproduziu muito a cultura machista ,(não conhecia outro
modelo) e uma mãe que mesmo dentro dessa cultura ,trabalhou ao lado dele e se legitimou
como mãe, mulher de ação, autoridade respeitada;um não invalidava a palavra do
outro.
Ambos enfatizavam para nós ,filhas mulheres, a necessidade
de estudar,ter profissão e não depender de marido, nem de ninguém.
Eu não gostava de
ver mulheres passando por situações
constrangedoras com seus cônjuges e mesmo sem expressar verbalmente ,pensava
que não queria aquele tipo de relacionamento pra mim.
A entrada de uma nova mulher que se casa com um moço da
família,traz para a nossa realidade uma outra forma de viver e de ser mulher .
Era uma mulher que trabalhava fora, dirigia carro,
independente,não morava com os pais, que namorava,sabia o que queria, se
mantinha...
Isso em Goiás, em 1974, era raro, rs...
Hum...desejos foram acesos,sonhos despertados... E...
Os amigos das minhas irmãs cantavam pra elas... “Toda donzela tem um pai que é uma fera”...
As mudanças vieram.
Apesar de garota,adolescente
romântica ,sonhadora,”menininha do
papai” ...verdade é que eu sempre trouxe
,talvez bem escondido, um grande par de asas e um desejo imenso de levantar
vôos...não era de peitar mudanças ,mas pegava carona nas conquistas.
O tempo passou ,as conquistas foram avançando, o contexto
mudando...
E olha onde fui parar , em um programa de gênero...
Minha mãe, não há muito
tempo,quando uma senhora se referiu a
mim vislumbrando um casamento com o filho dela (meu namorado na época), falou
“com boca cheia”: “Minha filha só casa se
quiser,é estudada,trabalha,não depende de senhor ninguém, dirige,viaja
pra onde quer ,conhece quase todo o país.”
Pra minha mãe, ter
filhas assim era um orgulho;pra uma mulher que viveu o que ela viveu,uma
conquista indescritível!
Atualmente ,penso que as relações homem /mulher estão cada
vez mais complexas...
“Novas”mulheres implicam em “novos” homens! Novos “modelos” de
relacionamento.
E dizem por aí que muitos homens estão perdidos,sem saber
seu papel nesta nova configuração...outros assustados...outros curtindo ...e
muitos ,muitos,ainda reproduzindo a cultura machista...cometendo atrocidades
com a crença de donos,proprietários de mulheres...
E assim temos tanto o que caminhar...
E as mulheres?
Hoje somos,em nossa grande maioria, mulheres provedoras,
desejosas de direitos e sabedoras das nossas responsabilidades.
Poucas,mas significativas, ocupando cargos de poder e
decisão.
Somos maioria nas universidades.
Muitas sobrecarregadas com a ausência ou omissão dos
companheiros.
Há jovens feministas engajadas.
Há algumas que conseguiram afinar o discurso com seus
companheiros e estão construindo um novo modo de viver.
Mas há aquelas que ainda
vivem submissas e oprimidas.
Há ainda uma parcela de jovens garotas que talvez não tenham se conscientizado da
batalha de tantas mulheres no decorrer da história e que parecem sofrer de uma
nostalgia tardia , agem cobrando de seus parceiros o papel de
provedor,salvador,herói e os vêem como algoz quando estes não correspondem as
suas expectativas.Muitas agem como dondocas, bonecas de luxo;isentando –se da
co-responsabilidade na relação homem /mulher, se vitimizando e jogando pra cima
dos companheiros toda a responsabilidade de fazerem –nas felizes.
Tenho ouvido homens contando as tiranias que vivem em suas
relações, a pressão para corresponderem ao papel de provedor, a culpa por não
conseguirem corresponder... Será o machismo as avessas?Rs...
É,meu amigo,minha amiga, a via é de mão dupla!
São movimentos interessantes...e várias realidades coexistindo...
E penso que a proposta do nosso programa ,mesmo diante de tantas mudanças de comportamento, continua atual ... se faz necessário uma nova
relação entre homens e mulheres ,onde não haja concorrência; que não seja
patriarcado ,nem matriarcado;mas uma relação pautada na co- responsabilidade,na
cooperação, no companheirismo ; uma relação de pessoas completas que se vejam e
se sintam iguais...
Enquanto trilhamos “o caminho das pedras”,almejando o
caminho das flores , que não percamos de vista o maior bem que conquistamos e podemos
ter...
LIBERDADE... de ir e vir , de ser...MULHER...